ENTENDA A DIFERENÇA ENTRE EDUCAÇÃO POSITIVA E PERMISSIVA; TEMA REPERCUTE NO AMBIENTE ESCOLAR

Em que momento a educação positiva, sem violência ou autoritarismo, passa a ser permissiva? E quais os possíveis impactos na vida escolar de crianças e adolescentes? Essas podem ser dúvidas comuns aos pais e responsáveis, mas ganharam destaque nas redes sociais após o relato de uma professora de São Paulo sobre as dificuldades enfrentadas em sala de aula. Especialistas afirmam que realmente parece haver uma tendência à permissividade por parte dos adultos, o que pode causar reflexos negativos.
No vídeo publicado, a professora Rebeca Café afirma que está difícil dar aula para os filhos de pais que aplicam a educação permissiva e aponta que o modelo acaba sendo adotado na tentativa de “evitar traumas” nas crianças. No entanto, conforme a docente, os responsáveis “perderam a mão”, tornando complicada a convivência com as crianças, que não obedecem e não têm “noção de autoridade”.
— Dentro da escola não dá para a gente negociar com 30, 40 crianças ao mesmo tempo. Na escola, a hora do dever é a hora do dever, hora de acabar a brincadeira, ele tem que guardar o brinquedo dele, porque acabou a brincadeira — diz Rebeca em trecho da gravação.
Especialistas consultados pela reportagem de Zero Hora concordam que houve mudança no comportamento das crianças e adolescentes nos últimos anos. Apontam, entretanto, que as alterações não estão relacionadas apenas à permissividade dos pais, mas a fatores como o período de isolamento da pandemia e o uso excessivo de telas.
“Essas crianças ficaram um ano e meio fora da escola e isso vai deixar uma marca nessa geração que é de difícil correção. Há também uma superexposição a telas. As crianças passam de duas a três horas com telas depois que chegam em casa e, obviamente, isso interfere na capacidade de concentração, na prontidão e na paciência que elas têm de permanecer seguindo determinada orientação”, diz Fabrício dos Santos Indrusiak, do Colégio Nave, de Canoas.
Na visão do diretor, muitos pais sentem necessidade de “compensar” os filhos, já que passam boa parte do tempo envolvidos com o trabalho e as crianças ficam sonegadas de uma atenção mais qualificada. Isso ocorre quando aceitam atitudes e comportamentos que não aceitariam em outras circunstâncias, por exemplo.
Denise Armani, orientadora educacional da Escola Municipal de Ensino Fundamental Leocádia Felizardo Prestes, de Porto Alegre, observa que os pais perderam um pouco da posição de ser o adulto referência para os filhos com uma autoridade positiva. Ao conversar com os responsáveis, a pedagoga e psicóloga verifica que ocorre uma confusão de papéis, com os pais se colocando como amigos de crianças e adolescentes, sem estabelecer limites: “A permissividade é observada e o comportamento, principalmente dos adolescentes, causa dificuldades imensas em sala de aula. Eles perdem o respeito com o professor e saem falas como “ninguém manda em mim” e “não quero fazer”. Não querem estar na escola, falam palavrão, pedem aula online. É muito mais difícil essa questão das regras na escola e com a família também. Isso compromete muito o emocional e desencadeia transtornos”, acrescenta Danise Armani, orientadora educacional da Escola Municipal de Ensino Fundamental Leocádia Felizardo Prestes.
Priscila Cunha, psicóloga clínica e orientadora parental em educação positiva, explica que muitas pessoas questionam a parentalidade positiva porque entendem que esse modelo, que utiliza competência social e emocional, inteligência afetiva e trabalha com conexões sociais saudáveis, é permissivo. Contudo, para a educação positiva, a permissividade é a negligência — quando, por exemplo, os pais deixam os filhos no celular consumindo todos os conteúdos que querem, pelo tempo que desejam.
Na educação positiva, os pais criam formas de conexão para conseguir se relacionar com os filhos sem ou com o uso mínimo de telas — já que vivemos em uma realidade onde, às vezes, é preciso lançar mão desse recurso.
— Muitos pais pensam que educação positiva é deixar a criança fazer o que ela quiser. E a educação positiva é se relacionar com a criança com cuidado, com respeito, com amor e, principalmente, com significado. Ela vai imprimir um estilo de vida inclusivo, onde a criança e o adulto vivem em um meio saudável. Isso vai gerando um ambiente de colaboração, de amor e de afeto — defende Priscila.
Denise acrescenta que a educação positiva tem como principal objetivo ensinar habilidades socioemocionais e validar os sentimentos das crianças. Por isso, há diálogo e conforto. Em sua função, a orientadora busca conversar com os alunos e entender o que ocorreu e o que estão sentindo diante de conflitos com professores e colegas.
A especialista reforça que as crianças e adolescentes precisam refletir e entender as consequências de seus comportamentos. Na visão de Denise, essa alternativa oferece um efeito positivo muito maior, porque as crianças aprendem a se posicionar e dialogar sem medo. Sendo assim, também vale para o ambiente escolar.
— Tem que ter afeto, mas ser firme. Não adianta só dizer que algo está decidido e pronto, tem que explicar o motivo, explicar que existem combinados e regras. Não pode castigar, chantagear. A permissividade também tem isso, de permitir determinadas coisas por chantagem, daí as crianças perdem a pessoa que faz a contenção, quando precisam ter segurança. Quando não têm, vão testar de todas as formas e ficar confusas — comenta Denise.
Para Priscila, a tendência à educação permissiva está muito relacionada às escolhas dos adultos. O problema é que esse modelo causa uma série de impactos negativos nas crianças e nos adolescentes, como desconexão com a família, falta de senso de coletividade e de competências emocionais e sociais para conviver com outras pessoas.
Para que os adultos possam fazer escolhas saudáveis na criação dos filhos, Priscila enfatiza que é fundamental contar com uma rede de apoio envolvendo o restante da família, escola e profissionais de saúde. Indrusiak complementa que o maior desafio das instituições de ensino hoje é compreender que não se limitam mais ao acadêmico e que precisam dialogar com as famílias de forma ativa, bem como dizer aos pais de que essa parceria precisa ocorrer para construir os limites das crianças.
— Noto uma geração de pais que já começou a se conscientizar de que as coisas não estão bem e, mesmo que não saibam como fazer melhor, já têm uma escuta muito melhor, querendo entender como fazer. Temos recebido bastante pedidos de ajuda de manejo, de como educar os filhos, como estabelecer limites e como construir situações respeitosas. Acho que esse é um bom caminho — afirma.
O documento O Cuidado Integral e a Parentalidade Positiva na Primeira Infância, desenvolvido pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) Brasil, apresenta quatro estilos parentais: permissivo, ausente, autoritário e participativo ou autoritativo.
O permissivo está relacionado aos pais que são excessivamente tolerantes e estabelecem poucas regras e limites aos filhos.
O ausente refere-se aos responsáveis que se concentram mais em suas próprias necessidades do que nas de seus filhos e são considerados pouco presentes na vida das crianças, demonstrando baixo nível de suporte e disciplina.
O autoritário é caracterizado por pais que são rígidos, controlam e avaliam o comportamento do filho conforme regras de conduta estabelecidas, demonstram pouco afeto e utilizam a punição para controlar a criança.
Já o participativo ou autoritativo está relacionado aos responsáveis que estabelecem regras, orientam de forma clara os comportamentos, valorizam os esforços, respeitam a individualidade da criança, possuem uma comunicação aberta, compreensão e empatia, e oferecem suporte emocional aos pequenos.
Fonte: portal de notícias GZH


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